sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Sociologia



1 Introdução à Sociologia

1.1 O que é Sociologia

- Para esta análise: leitura dos capítulos 1 e 2 do livro: “MARTINS, Carlos Benedito. O que é sociologia. Ed. Brasiliense: SP, 2008”.

- Surgimento
Disciplina relativamente nova. Surgiu como uma das manifestações do pensamento moderno. A evolução do pensamento científico intenta cobrir uma nova área do conhecimento humano ainda não incorporada ao saber científico, qual seja, o mundo social.
Reinaldo Dias (2005, p. 3) diz que a sociologia surgiu seguramente no século XIX como decorrência da necessidade dos homens de compreender os inúmeros problemas sociais que estavam aparecendo.
Enquanto ciência, a sociologia tinha o objetivo de sistematizar o estudo dos fenômenos sociais em busca de resolução aos problemas sociais. Os sociólogos buscam compreender as diferentes interações entre as pessoas para que possam estabelecer relações de causa e efeito dos diferentes fenômenos sociais e “assim indicar para as organizações públicas e privadas maneiras de atender às necessidades dos indivíduos, buscar os seus direitos, estabelecer os seus deveres ou o que quer que seja para a humanidade como um todo avance em busca de melhor qualidade de vida” (DIAS, idem).
Augusto Comte (positivista): “as sociedades estavam em estado de caos social, era necessário restabelecer a ordem nas idéias e nos conhecimentos”. Comte estabeleceu as bases iniciais do que seria uma ciência social, abriu perspectivas para um novo campo de pesquisa científica o qual se ocupou dos fenômenos sociais.

Surgimento da Sociologia: mudanças provocadas pela revolução científico-tecnológica (Revolução Industrial) iniciada no século XVIII. Influência também da Revolução Francesa de 1789.

Esse surgimento ocorre num contexto histórico específico: nos derradeiros momentos da desagregação da sociedade feudal e da consolidação da sociedade capitalista. (MARTINS, 2007, p. 10). Mudanças profundas no campo social.

As relações entre as pessoas de uma realidade rural (relações pouco complexas) passam a sofrer modificações em função das novas estruturas sociais que se desenvolveram em torno de uma nova realidade industrial complexa.

“(...) em cerca de cem anos, a Europa de sítios, rendeiros e artesãos tornou-se uma Europa de cidades abertamente industriais (...). Os utensílios manuais e os dispositivos mecânicos simples foram substituídos por máquinas, a lojinha do artífice pela fábrica. (...) Os aldeãos, como as suas antigas ocupações se tornavam supérfluas, emigravam para as minas e para as cidades fabris, tornando-se os operários da nova era (...), enquanto uma classe profissional de empreiteiros, financeiros e empresários, de cientistas, inventores e engenheiros se salientava e se expandia rapidamente”.(HENDERSON apud DIAS, 2005, p. 15).

Principais características da Revolução Industrial:

a) Transformação da economia inglesa, que passou de predominantemente agrária a uma economia industrial.

b) Relação patrão x empregado; homem x máquina.


Com o advento da Revolução Industrial, surgem novos papéis sociais, principalmente o empresário capitalista e o de operário.

Com a consolidação industrial se configura um ‘mercado de trabalho’, no qual se vendem as ‘capacidades de trabalho’ (na linguagem de Marx, a alienação da força de trabalho). Os novos trabalhadores industriais têm que empregar disciplinadamente sua força laboral em benefício dos detentores dos meios-de-produção, do local de trabalho, do maquinário e da matéria-prima (os capitalistas).

“o empresário capitalista foi pouco a pouco concentrando as máquinas, as terras e as ferramentas sob o seu controle, convertendo grandes massas humanas em simples trabalhadores despossuídos. Cada avanço com relação à consolidação da sociedade capitalista representava a desintegração, o solapamento de costumes e instituições até então existentes e a introdução de novas formas de organizar a vida social” (MARTINS, 2007, p. 12).

Em decorrência da rápida urbanização, é provocado o aumento de problemas sociais, como ausências de moradia, miséria, precariedade de serviços sanitários e de saúde, prostituição, alcoolismo, suicídios, infanticídios, surtos de violências e de epidemias (cólera, tifo) entre outros.

Características fundamentais das novas formas de organização social:

a) Substituição progressiva do trabalho humano por máquinas

b) A divisão do trabalho e a necessidade de sua coordenação (que resulta no empobrecimento intelectual do empregado e não do aumento da habilidade individual).

c) Mudanças culturais no trabalho (problemas na gestão do fator humano – imposição de disciplina rígida e articulação dos indivíduos isolados);

d) Produção de bens em grande quantidade;

e) Surgimento de novos papéis sociais (empresário X operário). Agora os trabalhadores não vendiam mais os seus produtos, mas sua ‘capacidade de trabalho’.
- Surgimento do proletariado:

Um dos pontos mais significativos dos anos que se seguiram a este estado de coisas foi o surgimento do proletariado, que desempenha um papel histórico essencial ao desenvolvimento da sociedade capitalista.

Os trabalhadores começam a negar suas condições de vida. Passam a se revoltar e destruir máquinas, sabotar oficinas, cometer roubos e crimes, evoluindo para as associações livres, criação de sindicatos, etc. A classe operária começou a organizar-se.


- Todos esses eventos de impacto social profundo colocaram a sociedade num plano de análise. A sociedade passa a se constituir em “problema”, em “objeto” a ser analisado.

Os primeiros homens que se preocuparam com essas transformações não eram homens da ciência (ainda), mas homens que, pela ação, queriam empreender uma mudança (no século XVIII para o XIV: Owen, Willian Thompson, Jeremy Bentham, por exemplos).

A sociologia surge como constituição de um saber sobre a sociedade, ela constitui uma resposta intelectual às novas situações colocadas pela revolução industrial.


- Mudança no pensamento:

Não só as transformações sociais foram importantes no surgimento da sociologia, mas também uma mudança no pensamento:

Renúncia a uma visão sobrenatural para explicar os fatos, substituindo-a por uma indagação racional. Há modificações na forma de se conhecer a natureza e a cultura.
A experimentação e o método científico são aplicados para o conhecimento da natureza (domínio racional da natureza). O progresso nesse campo é intenso, desde Copérnico a Newton.
A crença cede lugar à dúvida metódica a fim de possibilitar um conhecimento objetivo da realidade.

Esse conhecimento deveria ser estendido e aplicado ao estudo da sociedade. Passa-se a buscar leis gerais sobre a sociedade, campo em que deveriam ser evitadas conjecturas e especulações (Ferguson apud Martins, 2007, p. 19).

O método é o empírico e indutivo (baseado no método das ciências da natureza).

Compreensão de uma lógica do processo histórico (Vico, Hegel, Marx).

Alie-se a esses fatos que o iluminismo e a revolução burguesa (1789) questionavam as instituições da época denunciando-as injustas e irracionais, que atentavam contra a natureza dos indivíduos e impediam a liberdade do homem.

Surge uma crescente racionalização da vida social. As instituições começam a ser vistas como produtos da atividade do próprio homem, e não fenômenos sagrados e imutáveis. Sendo produtos do homem, elas podem ser transformadas com a ajuda da filosofia e da sociologia (Marx).

A partir da terceira década do século XIX intensificam-se as crises econômicas e as lutas de classe na sociedade francesa. A burguesia, já no poder, começa a utilizar as instituições estatais para conter o movimento social e a “desordem”. Tornam-se evidentes os motivos da revolução burguesa (em prol da burguesia, que se torna elite).


A Revolução segue seu curso: à medida que vai aparecendo a cabeça do monstro, descobre-se que, após ter destruído as instituições políticas, ela suprime as instituições e muda, em seguida, as leis, os usos, os costumes e até a língua; após ter arruinado a estrutura do governo, mexe nos fundamentos da sociedade e parece querer agredir até Deus; quando essa mesma Revolução expande-se rapidamente por toda a parte com procedimentos desconhecidos, novas táticas, máximas mortíferas, poder espantoso que derruba as barreiras dos impérios, quebra coroas esmaga povos e – coisa estranha – chega ao mesmo tempo ganhá-los para a sua causa; à medida que todas as coisas explodem o ponto de vista muda. O que à primeira vista parecia aos príncipes da Europa e aos estadistas um acidente comum na vida dos povos, tornou-se um fato novo, tão contrário a tudo que aconteceu antes no mundo e no entanto tão geral, tão monstruoso, tão incompreensível que, ao apercebê-lo, o espírito fica como que perdido (Alexis de Tocqueville apud Martins, 2007 p. 24-26).

Passada a revolução, alguns pensadores franceses como Durkheim e Comte começam a fomentar uma ciência social ao buscar entender a nova realidade provocada pela revolução. Esses pensadores nutriam certo rancor pela revolução, principalmente pelos seus falsos dogmas (liberdade, igualdade e importância do indivíduo em face das instituições sociais). Esses primeiros teóricos começam a utilizar os termos “anarquia”, “perturbação”, “crise”, “desordem” para julgar aquele estado de coisas.

Os novos teóricos propõem racionalizar a nova ordem e encontrar soluções. Para tanto era necessário conhecer as “leis” (científicas) que regem os fatos sociais.

Saint-Simon: “a filosofia do último século foi revolucionária; a do século XX deve ser reorganizadora” (apud Martins, 2007, p. 28).
Auguste Comte: “a nova teoria positiva da sociedade deve ensinar os homens a aceitar a ordem (industrial) existente, deixando de lado sua negação” (idem).

- A sociologia, nova ciência da sociedade, surge com fins e interesses práticos.

A nova ciência assumia como tarefa intelectual repensar o problema da ordem social, enfatizando a importância de instituições como a autoridade, a família, a hierarquia social, destacando a sua importância teórica para o estudo da sociedade.

Mas, no início, a sociologia surge tentando instaurar um estado de equilíbrio, pregando a ordem e a obediência (como a defesa do papel chefe de família por Le Play). A sociologia revestiu-se de indisfarçável conteúdo estabilizador, ligando-se aos movimentos de reforma conservadora da sociedade.

Auguste Comte intentava atribuir o status de ciência natural à sociologia, inclusive separando-a, por seu objeto, da filosofia e da economia:



Entendo por física social a ciência que tem por objeto próprio o estudo dos fenômenos sociais, segundo o mesmo espírito com que são considerados os fenômenos astronômicos, físicos, químicos e fisiológicos, isto é, submetidos a leis invariáveis, cuja descoberta é o objetivo de suas pesquisas. Os resultados de suas pesquisas tornam-se o ponto de partida positivo dos trabalhos do homem de Estado, que só tem, por assim dizer, como objetivo real descobrir e instituir as formas práticas correspondentes a esses dados fundamentais, a fim de evitar, ou pelo menos mitigar, quanto possível, as crises mais ou menos graves que um movimento espontâneo determina, quando não foi previsto. Numa palavra, a ciência conduz à previdência, e a previdência permite regular a ação. (apud Martins, 2007 p. 32).


- A sociologia só se liga ao socialismo e ao comunismo posteriormente. À época de Comte se pretendia colocar em questão os fundamentos da sociedade capitalista por intermédio de um estudo por uma ciência positivista.


1.2 O Positivismo

- O positivismo foi uma reação intelectual conservadora às transformações desencadeadas pela Revolução Francesa e Industrial, transformações que não eram previstas pelos filósofos e intelectuais (urbanização, miséria, suicídio, epidemias, etc.).
- Esses conservadores construíram suas obras contra a herança iluminista que, na visão de Auguste Comte, só fazia criticar as velhas instituições sociais (negativismo). O Positivismo tinha a intenção de construir (positiva, portanto) uma nova coesão social, uma nova sociedade saudável sob o solo de instituições fortes como a família, a religião e o grupo social.

- Não obstante, antes de se falar propriamente dos positivistas, é mister mencionar os críticos pioneiros aos revolucionários, os pensadores conhecidos como profetas do passado.
- Os conservadores que foram chamados profetas do passado construíram suas obras contra a herança dos filósofos iluministas. A inspiração desses “profetas” era a sociedade feudal, com sua estabilidade e acentuada hierarquia social (não defendiam propriamente o capitalismo por sua faceta industrial e financeira).
- Responsabilizavam os iluministas e suas idéias como desencadeadores da Revolução de 1789 (um castigo de Deus à humanidade, segundo tais conservadores).
- Os conservadores, defensores fervorosos das instituições religiosas, monárquicas e aristocráticas, que se encontravam em processo de desmoronamento, consideravam as crenças iluministas como aniquiladoras da propriedade, da autoridade, da religião e da própria vida. Julgavam a época moderna era dominada pelo caos social. A Revolução de 1789 era o último elo dos acontecimentos nefastos iniciados com o Renascimento, a Reforma Protestante e a era da razão.
- Exemplos desses pensadores: Edmund Burke (1729-1797), Joseph de Maistre (1754-1821), Louis de Bonald (1754-1840).

- Pois bem. Estes profetas do passado, conservadores, constituíram um ponto de referência para os pioneiros da sociologia, interessados na preservação da nova ordem econômica e política que estava sendo implantada na Europa daquela época.
- Mas estes pioneiros adaptaram as concepções dos profetas do passado às novas circunstâncias históricas. Não era possível o retorno à sociedade feudal e a restauração de suas instituições. Mas o que encantava os pensadores pioneiros da sociologia era a devoção daqueles “profetas” na tentativa de manutenção da ordem.

- Os primeiros positivistas, Sait-Simon (1760-1825), Auguste Comte (1798-1857) e Émile Durkheim (1858-1917), revisaram algumas das idéias conservadoras e as adaptaram na tentativa de alcançar meios de manutenção da ordem na nova sociedade, defendendo os interesses dominantes da sociedade capitalista (Martins, 2007 p. 40).

- Saint-Simon é considerado o mais eloqüente dos profetas da burguesia, um entusiasta da sociedade industrial. Para ele as relações sociais haviam se tornado instáveis e o problema a ser enfrentado era o da restauração da ordem. Via no industrialismo a possibilidade de satisfação das necessidade humanas e constituía a única fonte de riqueza e prosperidade.
- A função do pensamento social neste contexto deveria ser a de orientar a industria e a produção.
- Para Saint-Simon a ciência poderia desempenhar a função de conservação social como fez a religião na época medieval.
- Os fabricantes, comerciantes e banqueiros seriam os novos suseranos (senhores feudais). Esta elite estabeleceria os objetivos da sociedade e comandaria a classe trabalhadora.
- Os ímpetos revolucionários deveriam ser freados e a melhoria da condição de vida dos trabalhadores partiria (seria de iniciativa) da elite formada pelos industriais e cientistas.
- Saint-Simon tinha uma faceta progressista, que se tornaria, posteriormente, influência ao socialismo.

- Auguste Comte foi secretário particular de Saint-Simon, tendo acatado algumas de suas idéias. Comte era um pensador inteiramente conservador e um defensor sem ambigüidades da nova sociedade (que deveria ser criada com base na ordem).
- Culpava também os iluministas por terem disseminado o veneno da desintegração social.
- A proposta de Comte era o restabelecimento da ordem nas idéias e nos conhecimentos, criando um conjunto de crenças comuns a todos os homens.

- Para o conhecimento humano, Comte buscou os princípios para o seu estabelecimento sob uma base positivista (a verdadeira filosofia deveria proceder de forma positiva diante da sociedade).

- A sociologia, ao lado das demais ciências naturais (matemática, biologia, física, química) deveria se formas como uma física social. Ela deveria utilizar em suas investigações os mesmo procedimentos das ciências naturais, tais como a observação, a experimentação, a comparação, etc.

- Ordem e progresso constituíram os termos centrais da proposta de Comte. Deveriam ser elementos da nova sociedade. Mesmo conservador, ele achava que as idéias dos profetas do passado impediam o progresso. De outro lado, as idéias revolucionárias, em que pese pregassem o progresso, esqueciam-se da ordem.


- Émile Durkheim também tinha uma preocupação constante com a questão da ordem. De modo sistemático ocupou-se de estabelecer o método de investigação da sociologia.
- Na época dele as idéias socialistas ganhavam terreno (e já havia sindicatos e greves aconteciam).
- Ele discordava das teorias socialistas porque elas devam uma ênfase muito significativa aos fatos econômicos para diagnosticar a crise européia. Para Durkheim esse problema não tinha uma natureza econômica, mas advinha de uma fragilidade moral da época em orientar adequadamente o comportamento dos indivíduos. Para ele, também, era necessária a ordem.
- A proposta dos socialistas de redistribuição de riquezas e modificações na propriedade (medidas de natureza econômica) não contribuía para a solução da “doença social”.

- Seria fundamental, dessarte, o encontro de novas idéias morais capazes de guiar a conduta dos indivíduos – a ciência poderia encontrar soluções nesse sentido.

- Possuía uma visão otimista da nascente sociedade industrial. Dizia até que a divisão do trabalho não era prejudicial ao trabalhador e não originava conflitos sociais, mas um benefício que aumentava a solidariedade e a cooperação entre os homens.

- O problema, repisa-se, era a falta de valores morais aptos à coesão social. Isso fazia com que a sociedade industrial mergulhasse num estado de anomia, um estado de ausência de regras claramente estabelecidas. A sociedade era incapaz de exercer controle sobre o comportamento de seus membros, ela estava doente (mostra disso era a crescente quantidade de suicídios em sua época).

- A sociologia deveria se preocupar com os fatos sociais que se apresentavam aos indivíduos como exteriores e coercitivos. Os fatos sociais já existem antes mesmo do nascimento das pessoas e são, para elas, verdadeiras e significativas influências de comportamento (exemplo: o direito, os costumes, as crenças tradicionais, as crenças religiosas, o sistema financeiro, etc.).

- Para a saúde social, para o bom funcionamento da sociedade eram necessários incentivos à moderação dos interesses econômicos, a ênfase na noção de disciplina e dever , assim como a difusão ao culto à sociedade, às suas leis e hierarquia existente.

A função da sociologia, nessa perspectiva, seria a de detectar e buscar soluções para os “problemas sociais”, restaurando a “normalidade social” e se convertendo dessa forma numa técnica de controle social e de manutenção do poder vigente. (Martins, 2007, p. 50).


1.3 A abordagem Funcionalista

A investigação funcionalista busca explicação das instituições sociais e culturais em termos de contribuição que estas fornecem à manutenção da estrutura social.

- O funcionalismo estuda os fenômenos sociais a partir das funções que desempenham na sociedade. Considera que a sociedade é uma totalidade orgânica na qual os diferentes elementos se explicam pela função que preenchem, pelo papel que desempenham, pelo modo que estão ligados uns aos outros no interior desse todo. As partes do todo são inter-relacionadas e interdependentes.

- Organicismo biológico de Herbert Spencer: os organismos sociais, quanto mais crescem, mais se tornam complexos, ficando as partes mutuamente dependentes. Análise das estruturas, órgão e funções.

- Cada costume, cada crença, cada objeto material tem uma função vital, representando uma parte insubstituível do todo orgânico (como doutrina Bronislaw Malinowski 1884-1942).

O sistema social é entendido como unidade funcional e a estrutura social é o acordo entre as pessoas que têm entre si relações institucionalmente controladas e definidas. A perspectiva funcionalista leva em conta o olhar do observador, e não do agente social. A função social se refere às conseqüências objetivas e observáveis, não as intenções subjetivas dos participantes (Robert Merton apud Dias, 2005, p. 27).
Daí a diferenciação entre função manifesta (obtida por uma percepção objetiva de uma ação ou instituição social) e função latente (não imediatamente observada pelo participante, embora verdadeira). Exemplo: a escola. Tem a função de transmitir às futuras gerações os conhecimentos acumulados (manifesta), ou a função de controle social, reproduzindo os valores aceitos e que invariavelmente não podem ser questionados (latente)?

2 O indivíduo e a sociedade

2.1 A cultura


É algo inerente ao ser humano. Não há cultura fora dos humanos. O homem, ao contrário de outros animais, não vive no mundo natural tal como esse lhe foi apresentado.
A cultura se origina quando o homem começa a se diferenciar de outros animais (há milhares de anos), quando ele começa a utilizar instrumentos que facilitam sua ação cotidiana, começa a usar agasalhos e a se organizar além do que sua condição biológica lhe exigia (não só satisfazia as necessidades que sua condição biológica lhe impunha como a necessidade de comer, de se reproduzir, de se defender, de se proteger do tempo, etc.).
A capacidade de adaptação do homem propicia sua adaptação aos locais em que decidia viver. Essa capacidade não o prendia a nenhum nicho ecológico.
A capacidade de intervenção do homem na natureza aumentou e pouco a pouco foi diminuindo sua dependência aos limites impostos pelo instinto biológico.

Esses atos, procedimentos e criações que foram desenvolvidos pelo homem e que não estavam relacionados com o instinto natural é o que denominamos cultura.
O simples uso de uma pedra como peso para papel, por exemplo, é cultura.

E o meio cultural socializa novas gerações tornando o ser humano um herdeiro de um longo processo acumulativo que reflete o conhecimento e a experiência adquiridas pelas numerosas gerações que o antecederam. “A manipulação adequada e criativa desse patrimônio cultural permite as inovações e as invenções” (Laraia apud Dias, 2005, p. 50).

Dessarte, vê-se que sociologicamente (cientificamente) o conceito de cultura se distingue do sentido comumente partilhado pelo senso comum (quando se diz, por exemplo, que fulano tem muita cultura porque possui uma quantidade de conhecimento admirável, ou quando se diz que a cultura do índio é inferior à do homem branco). Todos os seres humanos possuem cultura, e esta não pode ser melhor ou inferior a outra – serão somente diferentes.
Assim, afirmar que uma pessoa tem mais cultura que a outra constitui um juízo de valor emitido a partir do referencial de determinada cultura (etnocentrismo).

O entendimento do real significado da cultura, da relatividade dos hábitos, costumes e valores - frente à diversidade – e da sua transitoriedade poderão tornar o ser humano mais tolerante, pois aquilo que nos parece adequado pode ter diferentes significados em outros lugares.

Como se disse, a cultura é um fenômeno eminentemente humano. Não há cultura fora dos humanos. Toda criação humana, material ou não material, é cultura; onde não há intervenção ou criação humana temos somente a natureza. Podemos falar, portanto, na existência de meio ambiente natural e meio ambiente cultural.

O ambiente cultural do homem inclui, por exemplo, as vilas, as aldeias, as cidades os animais domésticos, as plantações, os novos relacionamentos entre os indivíduos, a linguagem, as crenças, as religiões, a música, a tecnologia etc.

Subcultura - Conjunto de traços comuns entre indivíduos que estão ligados a um outro conjunto maior (que abarca maiores diversidades) que é a cultura. A cultura humana é formada por um número indeterminável de subculturas, que podem ser estudadas como unidades bem caracterizadas. Assim podemos falar da cultura francesa, da indiana, da brasileira, que são subculturas da cultura humana em geral.

Vejam-se algumas definições de cultura:
- Sistema de idéias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracteriza uma sociedade.

- Conjunto acumulado de símbolos, idéias e produtos materiais associados a um sistema social, seja ele uma sociedade ou uma família.

- “Cultura é aquele todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, direito, costume e outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. (Tylor, 1871).

A cultura abrange tudo o que foi criado pela humanidade, tanto do ponto de vista material como não material. Inclui idéias, valores, manifestações artísticas de todo tipo, crenças, instituições sociais, conhecimentos científicos e técnicos, instrumentos de trabalho, tipos de vestuário, alimentação, construção, etc.

É a cultura que estabelece os limites no qual se desenvolve toda a ação social (por exemplo, pode-se ser mais efusivo no cumprimento em determinada cultura; pode-se fazer do almoço um momento de discussão, de euforia, ou de silêncio; o adultério ou a poligamia podem ser tidos como condutas aceitáveis ou não...).



- Características principais segundo Reinaldo Dias (2005, p. 51/52):

a) É transmitida pela herança social (e não biológica);

b) Compreende a totalidade das criações humanas;

c) É uma característica exclusiva das sociedades humanas;

d) A cultura é construída e partilhada por membros de uma determinada coletividade

e) Há na cultura elementos tangíveis (ex. instrumentos) e intangíveis (ex. crenças), assim como elementos materiais e imateriais.

f) A cultura se manifesta por meio de variados sistemas: valores, normas, ideologia, etc. que influenciam decisivamente a personalidade individual.


Entre as variadas manifestações concretas de uma cultura, há que destacar:

a) Vida material: produção necessária para se garantir a sobrevivência: ferramentas, conhecimento, técnicas, etc. Processos que uma cultura utiliza para produzir bens e serviços e sua distribuição e consumo;

b) Interações sociais: os papéis que a população e as pessoas assumem e os padrões de autoridade e de responsabilidade. Esses são confirmados pelas instituições sociais que se reafirmam (cultos, ritos, festas, educação, chefia, etc.);

c) Linguagem: considerada não somente no sentido oral. Estende-se à totalidade da manifestação e comunicação simbólica, na qual se incluem a fala, os gestos, as expressões, os símbolos e outros mecanismos de manifestação do indivíduo;

d) Estética: revela os padrões culturais de beleza e sua expressão (nos desenhos, estilos, cores, movimentos, emoções, artes, posturas preferidas, etc.)

e) Religião: influencia na percepção que uma cultura possui sobre a vida, seu significado e seu conceito. Também desempenha influência nos papéis sociais que o homem e a mulher devem desempenhar, estabelece relações de autoridade, as responsabilidades e os deveres dos indivíduos, etc.

f) Hábitos alimentares: a obtenção, a preparação e o consumo de alimentos estão inter-relacionados com muitos outros elementos universais de uma cultura, como a cerimônia, festas, tradições e divisão do trabalho. Por exemplo, algumas culturas não consomem carne de vaca, em outras não se consome a de porco.

- Outros conceitos importantes:

Processo de socialização é toda conduta que é aprendida e os seus resultados, cujos elementos são compartilhados e transmitidos pelos homens que compõem uma determinada sociedade. Na conduta se inclui tudo aquilo que o homem aprende e produz por meio de suas atividades, incluindo-se aspectos sociais, psicológicos e físicos.

Cultura de massa – aglomerado heterogêneo de indivíduos, que são tratados de forma homogênea pelos meios de comunicação. A cultura de massa é um produto típico da era industrial. É o produto da indústria cultural (TVs, rádios, jornais, revistas). A cultura de massa não é feita por aqueles que a consomem e se baseia numa economia de mercado (economia baseada no consumo de bens). A cultura de massa surge como funções do fenômeno da industrialização (cultura feita em série, para um grande número de pessoas e é trocável por uma quantia em dinheiro e que deve ser consumido como se consome qualquer outra coisa. Essa cultura não é vista, portanto, como instrumento de crítica e conhecimento).

Contracultura – manifestação cultural de grupos que rejeitam as normas e os valores da sociedade, buscando estilos de vida alternativos (como os antigos hippies, por exemplo). Mas se constitui uma subcultura da cultura mais geral.

Estrutura da cultura: formada por alguns elementos básicos (às vezes não aparentes como a estrutura de um edifício), tais como as crenças, os valores, as normas, as sanções, os símbolos, o idioma e a tecnologia, e que são transmitidos às novas gerações de modo formal e informal. A estrutura cria uma “rede de significados” que dá sentido às manifestações e às ações sociais.

Mas, como toda criatura se há de – fatalmente – voltar contra o criador, repetindo a revolta dos anjos e o crime dos nossos primeiros pais, também a cultura se haveria de libertar do homem e construir um objeto de sua especulação, como algo com que se encontra o homem em sua vida, já que a cultura é a herança social, e o homem herdeiro por condição ontológica. (Ortega apud Machado Neto, 1987, p. 156).


2.2 Instituições sociais


Instituição social é um sistema complexo, organizado e relativamente permanente de relações sociais, que incorpora valores e procedimentos comuns aos indivíduos e atende a certas necessidades básicas da sociedade. (Dias, 2005, p. 201).
No complexo sistema de interações sociais existentes nas diferentes sociedades, algumas repetitivas, rotineiras e esperadas tornam-se necessárias e, quando não ocorrem, acabam fazendo falta para uma determinada comunidade por cumprirem um papel naquela coletividade. Daí sua importância.
Nas instituições sociais as atividades são rotineiras e previsíveis, e as relações entre os vários tipos de membros vão ficando cada vez mais padronizadas.
Uma instituição social não é um órgão formal ou necessariamente uma instituição política. Por exemplo, uma luta de boxe (oferece entretenimento, vazão de agressividade, gera empregos, etc.), o jogo do bicho, a linguagem, ou o próprio Estado (que proporciona uma teia de relações entre pessoas, de empregos e satisfação a necessidades sociais). Todas as instituições, formais ou não, desempenham um papel social, têm diferentes status, mas visam suprir alguma necessidade.
Algumas surgem espontaneamente no decorrer do tempo e suas normas podem não estar codificadas em leis ou regulamentos.

De um modo geral, a maior parte das instituições fundamentais – além de legitimada pela aceitação social – é legalmente instituída. Mas outras existem e são legitimadas sem serem, como se demonstrou nos dois parágrafos acima, legalmente instituídas.
As instituições se desenvolvem gradativamente, conforme as necessidades de um povo.

- Instituições sociais básicas: algumas instituições estão presentes na maioria das sociedades, daí serem consideradas básicas. São exemplos a instituição familiar, a educacional, a religiosa, a econômica, o trabalho e a política.

- Alguns conceitos:

- Instituição é uma organização de normas e costumes para a obtenção de alguma meta ou atividades que as pessoas julguem importantes.
- Instituições são processos estruturados por meio dos quais grupos e indivíduos se esforçam para levar a cabo suas atividades.
- Instituições são conjuntos organizados de crenças e práticas.

O processo de institucionalização impõe normas, regras e regulamentos (como ocorre numa família, por exemplo, ou numa sociedade, numa comunidade...)

Todas as definições de instituições implicam um conjunto de normas de comportamento e um sistema de relações sociais pelo qual essas normas são implementadas.

Atenção: uma instituição não é um grupo enquanto tal, mas um conjunto de comportamentos e crenças que o grupo adota.

Nesse sentido a instituição social é diferente, por exemplo, de uma associação.


- Algumas características:

a) As instituições formam uma estrutura permanente dentro da qual operam a cultura e a estrutura social;
b) Todas as instituições apresentam alguns rituais como costumes, leis, cerimônias, vestimentas respectivas.
c) Elas tendem a regulamentar e controlar o comportamento dos indivíduos, pois incorporam os valores fundamentais adotados pela sociedade e as expectativas por ela aceitas. Qualquer desvio desse padrão pode gerar a exposição a um constrangimento (aspecto da coercibilidade do fato social);
d) As pessoas aprovam o comportamento institucionalizado porque elas dão estabilidade e consistência a seus membros. Os padrões de comportamento estabelecidos se tornam parte da tradição de uma determinada sociedade.
e) Por intermédio da institucionalização, o comportamento espontâneo e imprevisível é substituído pelo comportamento regular e previsível (ex: uma luta oficial de boxe é diferente de uma briga de rua; um campeonato organizado determina sempre o campeão de determinada categoria).
f) As instituições sociais se diferenciam dos grupos sociais. Os grupos sociais são formados por pessoas que têm um objetivo comum e estão interadas socialmente. As instituições referem-se às regras e aos procedimentos padronizados dos diversos grupos (ex: procedimentos que regulamentam as relações entre pai, mãe e filhos formam a instituição família. Mas a família pode ser vista como grupo social se observarmos o fato da interação e da existência de objetivos comuns a serem atingidos por eles enquanto grupo). Uma instituição não é, portanto, o grupo enquanto tal, mas, sim, um conjunto de comportamentos e crenças que o grupo adota.
g) As pessoas não pertencem às instituições (no sentido científico), embora possam integrar um determinado grupo social. Isto porque a instituição não é algo concreto, mas uma abstração (podemos ver igrejas, mas não uma religião; podemos ver operários, mas não a economia).
h) As instituições se diferenciam, outrossim, das associações. A cada instituição há, de um modo geral, pelo menos uma associação que realiza as funções daquela instituição. As associações têm nomes, podem ser localizadas em alguns espaços físicos; têm membros e são organizadas (ex: o Flamengo é uma associação ligada à instituição social esporte – Dias, 2005, p. 203).


Em resumo, uma instituição é um procedimento organizado, um modo estabelecido, pelo qual uma sociedade alcança seus objetivos.


- Quadro resumo:


INSTITUIÇÕES SOCIAIS
GRUPOS SOCIAIS
Referem-se a regras e aos procedimentos padronizados dos diversos grupos. (ex: regras e procedimentos entre pai, mães e filhos)
Pessoas que possuem objetivos comuns e estão em interação (ex: família enquanto grupo social).
Conjunto de comportamentos e crenças que o grupo adota.
ASSOCIAÇÕES
Abstrato (ex: a religião e não a igreja; o trabalhador e não a economia)
Grupo organizado de indivíduos que realiza as funções de uma instituição (têm nomes e podem ser localizadas fisicamente).
Modo pelo qual uma sociedade alcança seus objetivos.
De um modo geral, há pelo menos uma associação para realizar as funções de uma instituição.
Comportamento regular e previsível que substitui o espontâneo e imprevisível.
Exemplo: O Atlético é uma associação ligada à instituição futebol.


- Símbolos institucionais:

Os símbolos servem para designar uma determinada instituição e servem para lembrar sua existência.
Por exemplo, a Bandeira Nacional representa instituições políticas de um país e representa a fidelidade de um cidadão a seu país; o crucifixo representa uma instituição religiosa; uma aliança o casamento...


2.3 O Direito e a cultura

O mundo da cultura é uma região da realidade que o engenho humano ajuntou ao mundo natural. Ao intentar uma teoria sobre os objetos, o filósofo agrega, também ao mundo natural, uma ontologia desses objetos e uma construção de objetos ideais e valores que têm uma existência em si, independente do sujeito humano, embora seja este o único ser, em toda a natureza, capaz de intuí-los e desejá-los.

O homem cria valores, todos calcados em ideais humanamente construídos!

E só o homem, próprio criador, pode desejar e cultuar os ideais segundo valores sociais (certo, errado, bem, mal, justo, ruim, legítimo...).

O mundo dos objetos culturais participam ora do ser, ora do dever ser, do valor, como realidades que “são enquanto devem ser” (Machado Neto, 1987, p. 157). Assim se caracteriza, além de outros valores institucionais, o Direito.
O Direito é um dever ser, como se sabe, mas um dever traçado a partir de fatos sociais verificáveis (ser) aos quais são agregados valores (certo ou errado, por exemplo), relação dialética específica donde nasce a norma e o Direito (Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale).

Fato + Valor => Norma

O homem cria o Direito enquanto conjunto de valores que recebem, do Estado, tutela. O Direito nasce da necessidade humana (necessidade social de ordem e paz), a partir da criação de valores para fatos e objetos, de se guiar pelo dever ser.

Os atos que praticamos e os fatos que construímos (em que se pode resumir a cultura) são justificados mediante uma valoração que lhes dá um sentido, uma sucessão de estimativas, o ser do homem sendo o seu dever ser, como diria Miguel Reale em tese.

A cultura pode ser analisada com base nos valores que satisfazem as necessidades materiais e espirituais do homem. Por exemplo: o Verdadeiro, o Belo, o Bem, o Justo, o Sagrado, o Útil são valores fundantes das realizações culturais no plano da ciência e da filosofia, da arte, da moral, do direito, da religião, da economia, e tecnologia, respectivamente (MACHADO NETO, 1987, p. 158)

O Direito e socialmente a instituição que oferece segurança para as relações civis, regulação para is bens materiais, garantidor de status (nacionalidade, membro de família, cônjuge, menor, herdeiro, devedor, condômino, doador, etc.). Enquanto realizado e vivido na vida social, o Direito é um fenômeno cultural institucional como configuração de condutas.
E é passado e assimilado pelas pessoas por intermédio das normas, códigos, juízes, profissionais da praxe cotidiana, de docência universitária, da ciência, de profissão intelectual, etc.).


3 A desigualdade social, desvio social e controle social


3.1 Estratificação social e desigualdade

Divisão da sociedade em camadas (estrato: conjunto de pessoas que detêm o mesmo ‘status’ ou posição social). Os ocupantes dos estratos sociais têm acesso desigual a oportunidades sociais e recompensas (Dias, 2005, p. 154).
Todas as sociedades possuem desigualdades. A desigualdade social descreve uma condição na qual os membros de uma sociedade possuem quantias diferentes de riqueza, prestígio ou poder. Os estratos sociais se sobrepõem socialmente numa relação de hierarquia.

A utopia da igualdade a ser concretizada está na obtenção de direitos iguais a todos, independentemente de sua condição social, sexual, de raça, de etnia, etc. O atendimento das necessidades básicas – alimentação, moradia, saúde, bem-estar social, etc. – deve integrar os direitos fundamentais da existência humana.
Quando se diz “sociedade igualitária” está a se referir à igualdade de oportunidades que devem ter todos os indivíduos de determinada sociedade, sem discriminação de nenhuma espécie. Isso porque os homens (e mulheres e crianças) têm naturalmente diferenças em ralação aos outros (idade, sexo, força, resistência, velocidade, acuidade visual e auditiva, inteligência, beleza, etc.). É impossível uma sociedade de pessoas iguais.
As diferenças entre os homens permitirão que, ao longo de suas vidas, de acordo com a capacidade e a habilidade de trabalhar com aquilo que possui de melhor, avancem em termos de suprimento de suas necessidades, as quais, além de básicas compreenderão outras, de cunho estético ou artístico, por exemplo. Assim sempre existirá um grau de diferenciação social que formará camadas sociais hierarquizadas (e as pessoas, por seus gostos e trabalho, sempre irão se identificar com determinado grupo de pessoas e não outro).

As sociedades se tornam estratificadas por vários fatores, dentre os principais: a competição, o conflito, a divisão do trabalho e a especialização. Em menor grau, mas não menos importantes, estão as diferenças biológicas como as de sexo, de idade, de raça e de etnia.
A estratificação ocasiona barreiras sociais (exemplo: endogamia, a possibilidade de casamento somente entre pessoas da mesma raça, como acontecia na África do Sul na época do apartheid).

3.1.1 Estratificação social por Karl Marx

Estratificação social em Marx: conceito ligado à dimensão econômica, se estabelece nas relações de produção – traduzido na realidade das “classes sociais”: burguesia x proletariado (exploradores x explorados).

(...) a época da burguesia caracteriza-se por ter simplificado os antagonismos de classes. A sociedade divide-se cada vez mais em dois vastos campos opostos, em duas grandes classes diametralmente oposto as, a burguesia e o proletariado. (Marx e Engels apud Dias, 2005, p. 155).


3.1.2 Estratificação social por Max Weber

Estratificação social em Weber: a identifica por intermédio de três componentes ou ordens: a econômica, (classe: riqueza e renda); a social (status: prestígio); e a política ou legal (poder).
Existe relações entre elas, ou seja, a posição de uma pessoa em um sistema de estratificação refletiria um pouco da combinação de sua classe, de seu status e de seu poder.
Ao contrário de Marx, Weber diz que as classes sociais se estratificam segundo o interesse econômico, em função de suas relações de produção e aquisição de bens. A diferenciação econômica se mostra pelos rendimentos, bens e serviços que o indivíduo possui ou de que dispõe (o que está intimamente relacionado com a possibilidade de acesso que as pessoas têm ao mercado).


3.3 Desvio social e controle social


O controle que um grupo social exerce sobre seus membros é, muitas vezes, imperceptível, e nós mesmos exercemos um certo controle sobre nossos atos, aflorando um sentimento de culpa quando nos desviamos do que é considerado correto.

Esse controle é absolutamente fundamental para o funcionamento das sociedades (o contrário resultaria em desordem - Dias, 2005, p. 102).

Toda sociedade, sem exceções, estabelece regras de convivência entre seus membros, e sem elas, portanto, pode-se dizer que seria impossível a convivência social. As diferentes culturas toleram certos desvios sociais, não exigindo que todos os seus membros sigam durante todo o tempo as normas estabelecidas e aceitas consensualmente.
Mas a tolerância tem, obviamente, um limite. No momento em que o indivíduo, por seus atos, passa a afetar o funcionamento da sociedade entram em ação os mecanismos de controle social.

A regulamentação da vida social muitas vezes está codificada no direito – regras escritas interpretadas pela autoridade legitimamente aceita pelo grupo (no nosso caso um juiz; mas em outras sociedades podem ser um curandeiro ou um cacique indígena).
Todavia as normas nem sempre são escritas ou estabelecidas formalmente; neste caso estão tão interiorizadas nas pessoas que se tornaram costumes a serem seguidos sem que sejam questionados. Elas são aceitas pelos indivíduos do grupo e, quando um deles as transgride, sofre penalidades ou sente-se constrangido a ponto de se reprimir automaticamente (nesse caso o controle é auto-exercido). Exemplo: o uso do cinto de segurança – norma que foi posta em sociedade e interiorizada por seus membros a ponto de causar desconforto e insegurança àqueles que não a observam.

As normas sociais variam de sociedade para sociedade, desde hábitos simples a situações mais complexas (como o ordenamento jurídico, por exemplo). Essas normas derivam dos costumes. São exemplos: o rito de alimentação na China (onde se mostram os animais vivos na mesa do restaurante antes de cozinhá-los) é diferente no Brasil; no Marrocos não se come com o uso de talheres; os muçulmanos que se transformam em homens-bomba são considerados insanos no nosso país.

Vejam-se essas características:

As normas sociais não são estáticas, estão em constante mudança (como a cultura)
As normas estão baseadas em valores que a sociedade julga fundamentais para o seu funcionamento ordenado.

As normas e valores sociais são aceitos sem questionamento.
Valor impõe-se ao indivíduo como uma evidência e um absoluto (heteronomia).
Os valores variam com a civilização.
Os valores quando fortemente interiorizados, podem justificar atos que em outras sociedades seriam julgados como absurdos.
Quando os valores se transformam em ‘normas e costumes’, asseguram a regulamentação da vida dos indivíduos e dos grupos de uma sociedade.
As normas se tornam, assim, norte de um aprendizado social.

Os símbolos, nesse contexto, são importantes auxiliares do processo de socialização. Por exemplo: a erupção vulcânica, que pode significar manifestação dos deuses; gestos de saudação nazista; a mesa do diretor de uma empresa é destacada numa sala de reuniões, o que denota uma hierarquia entre os participantes; o herói-nacional; o operário-padrão, etc.

Os ‘símbolos’ são importantes auxiliares do processo de socialização.


3.3.1 Normas e costumes

Quando os valores se transformam em normas e costumes asseguram a regulamentação da vida dos indivíduos e dos grupos de uma sociedade.
São normas as idéias (fortalecidas) de certo e errado que se vinculam a determinados hábitos e costumes sociais. Devem ser entendidas como “obrigações sociais” às quais o indivíduo, ou ator social, está submetido. As normas suscitam a convicção de que a desobediência a elas acarretará algum tipo de problema.

As normas podem ser formais e informais.

FORMAIS ou legais: leis, decretos, códigos, estatutos. Estão codificadas no Direito e sancionadas pelo Poder Público. Podem ser, outrossim, normas dispostas no estatuto de determinada empresa, clubes esportivos, a proibição de fumar externada por um cartaz no corredor de um hospital, etc.

INFORMAIS: têm a mesma força coercitiva das formais, mas estão ritualizadas pelos hábitos e costumes. Exemplo: o costume de se sentar em uma cadeira e não no chão.

A institucionalização e a ritualização das normas são realizadas pela interiorização, mas também por um sistema de sanções. Em todo grupo existem aparelhos destinados a fazer serem as normas respeitadas e a aplicar as sanções (Dias, 2005, p. 109).
Mas nem sempre a institucionalização das normas significa que elas tenham forma jurídica (ex: respeito aos pais e aos mais velhos).

Valores gerais como solidariedade, segurança, êxito, honestidade, etc., quando aplicados a um determinado papel adotando uma forma estarão compondo normas.

Normas são fornecidas aos indivíduos – atores sociais – mais pelos seus grupos de referência do que pelo conjunto da sociedade (exemplo: estereótipos numa sociedade de massa: emos, góticos, punks, nerds, etc.).


3.3.2 O controle social

Para que serve o controle social?
Para a rotina e bom andamento – a ordem de uma sociedade apóia-se numa rede de papéis, milhares de pessoas cumprem o seu papel social, interagindo constantemente e mantendo a ordem social.

Nenhuma sociedade pode funcionar com êxito se o comportamento das pessoas não puder ser previsto de modo confiável (por exemplo, pode-se esperar o ônibus em determinado horário, que se ligue o computador porque tem energia, ou que a faculdade estará em funcionamento na tarde de hoje, se dia letivo).
A isso se dá o nome “ordem social”. Essa ordem é um sistema de pessoas, relacionamentos e costumes que opera para a realização do trabalho de uma sociedade (Dias, 2005, p. 109).

Para a rotina e bom andamento da sociedade a sua ordem se apóia numa rede de papéis, milhares de pessoas cumprem o seu papel social, interagindo constantemente e mantendo a ordem social.

Nessa ordem as pessoas assumem suas obrigações e conhecem seus direitos. Torna-se, então, fundamental ao funcionamento da ordem a criação de um mecanismo repressor para aqueles que não cumprem seu papel para que sejam coagidos a fazê-lo. Esses mecanismos formam o controle social.

Controle INFORMAL: utilizados casualmente pelas pessoas: sorrisos, olhares reprovadores, advertência verbal, etc.

Controle FORMAL: levado a cabo por agentes autorizados: policiais, empregadores, militares, etc.


O controle social pode ser feito de três modos diferentes:

Socialização: aprendizado, pelo individuo ao longo da vida, de seus papéis sociais e das crenças, valores, costumes, diretrizes de conduta. É o instrumento de maior controle e passa a ser feito pelo próprio indivíduo (exerce sobre si mesmo).
Pressão do grupo: a pressão grupal é sentida pelo indivíduo mesmo que inconscientemente. São manifestadas por aprovações (sorriso, tapinha nas costas, elogios – por grupos primários quando espontaneamente e informalmente – ou promoções, recompensas, títulos – por grupos secundários de uma maneira formal e por procedimentos padronizados), ou desaprovações (olhar de reprovação ou penalidades formais).
Sanções: sistema de recompensas e punições. Podem ser positivas (recompensas) ou negativas (punição). Podem ser formais (prisão, multa, externadas por órgãos oficiais) ou informais (beliscão, medo de se expor ao ridículo).

Quando falham os controles informais utilizam-se a força e a punição (legitimadas juridicamente). Ao Estado cabe o emprego legal das sanções físicas (ex: prisão, multa, cassação de direitos).
Por derradeiro, frisa-se que outras organizações, de modos diversos, punem fisicamente seus membros, como as gangues, a máfia (tortura, assassinato); a família (beliscões, puxões de orelha); a escola (suspensão, expulsão); a igreja (jejum, vigília).


3.3.3 Desvio social

Desvio social ou comportamento anormal (“a-normal”) – de quem não segue as normas, constituindo numa violação das regras sociais.
A caracterização de desvio social varia muito de sociedade e dentro destas nos mais diferentes grupos sociais. É considerado um comportamento anticonvencional.

São considerados anormais comportamentos criminosos, os da prostituta, do alcoólatra, mas também o são de um gênio musical, de um campeão, etc.

O fato desvio social é algo universal, está presente em todas as sociedades embora nelas sofra variações de conteúdo. São exemplos de desvios mais conhecidos em nossa sociedade: a delinqüência juvenil, o alcoolismo, o uso de drogas, o roubo, o estupro, a homossexualidade, o eremita, o hippie, o pecador, o santo, o avarento, o herói, as celebridades, etc. Alguns desvios são aprovados, outros não, e alguns toleráveis. Alguns são reprimidos legalmente e outros só pelos costumes.

Os atos de desvio são muitas vezes tolerados em nome da boa convivência – por exemplo os pais não sabem de tudo que fazem seus filhos, a igreja não exige que todos os seus freqüentadores sejam santos, etc.

Crime e desvio social não são, portanto, exatamente sinônimos!

Marginalidade

Fenômeno que designa o comportamento de quem pouco adere às normas sociais e, por isso, vive à margem do grupo social. Para que o individuo volte a viver de acordo com as normas é necessário um processo de socialização (reeducação).
O marginal tem suas próprias normas. “Escolheu” viver em desacordo com as normas sociais. Ele não tem condições de viver em sociedade e por isso precisa ser reeducado.

Crime

Desvio social que se caracteriza pela violação de normas sociais importantes.
Muitas normas legalmente instituídas são diuturnamente descumpridas pelos indivíduos, não são rigidamente cumpridas. São crimes passíveis de punição,mas há, para eles, certa tolerância pois praticados pelas pessoas comuns: ultrapassagem, na estrada, do limite de velocidade, a compra de CD pirata, o avanço do sinal vermelho, etc.
A sociedade e sua cultura definem, em certa medida, o limite de tolerância nesse sentido.


Anomia

Ao enfraquecimento das normas numa dada sociedade Durkheim deu o nome de anomia. O conceito designa uma desorganização tal da sociedade que enfraqueceria a integração dos indivíduos que não sabem as normas que devem seguir.

Numa sociedade ou grupo social em anomia faltará uma regulamentação durante certo tempo. Não se sabe o que é possível e o que não é, o que é justo e o que é injusto, quais as reivindicações e esperanças legítimas, quais as que ultrapassam a medida (Durkheim apud Dias, 2005, p. 114)

As regras e os valores sociais que guiam e legitimam a atuação dos indivíduos se tornam incertas, incoerentes e contraditórias. Resulta o desarranjo social denominado anomia.
As condutas anômicas são as marginais, muitas vezes ligadas à violência. Contudo, não se pode afirmar que anomia seja o mesmo que ausência de lei, embora aqueles que possuam uma conduta anômica possam violar a lei.

Numa sociedade em estado de anomia fica fácil a um líder carismático levar consigo a crença dos indivíduos por indicar a essas pessoas novos valores (personificados nesse líder) que oferecem a elas segurança. Nesse caso a anomia pode ter um resultado positivo ou negativo (como ocorreu com o nazismo liderado por Hitler, por exemplo).

Quando os indivíduos vivem em estado de anomia perdem o sentido de pertencer ao grupo. Muitas vezes o sujeito anômico se comporta como se tivesse perdido o passado, não previsse qualquer futuro e vivesse somente no presente imediato, o qual parece ser nenhum lugar (exemplo: prisioneiros dos campos de concentração – Dias, 2005, p. 114).


4 Principais pensadores clássicos da sociologia e seus conceitos


4.1 Émile Durkheim (1858-1917)

Um dos grandes teóricos da sociologia, Durkheim definiu com clareza o objeto dessa ciência: os fatos sociais (na obra As regras do método sociológico, de 1895 – Costa, 1997, p. 59).



4.1.1 Investigação sociológica

Sobre a investigação sociológica, Durkheim propôs a abordagem objetiva dos fatos sociais, ou seja, o cientista pesquisador deve se distanciar desses fatos, mantendo-se neutro em relação à influência particular que eles imprimem.
Ademais, é preciso que o sociólogo deixe de lado suas prenoções, isto é, seus valores e sentimentos pessoais em relação ao acontecimento a ser estudado. Há que se eliminar todos os traços de subjetividade na análise científica.
Por essa razão, tendo a pretensão de desenvolver a sociologia compassada às demais ciências naturais, Durkheim diz que os fatos sociais devem ser considerados como coisas. As opiniões individuais mascaram a realidade que só pode ser apreendida pelo cientista.

4.1.2. Fato social

Fato Social: toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior. É geral na extensão de uma sociedade dada. São as maneiras de agir, de pensar e de sentir exteriores ao indivíduo, dotadas de um poder de coerção em virtude do qual se lhe impõe.

É algo dotado de vida própria, externo aos membros da sociedade e que exerce sobre seus corações e mentes uma autoridade que os leva a agir, a pensar e a sentir de determinadas maneiras.
São três as características essenciais dos fatos sociais:

Coerção social (coercibilidade) – força que os fatos exercem sobre os indivíduos, levando-os a agir de determinada maneira, conformando-se às regras da sociedade em que vivem, independentemente de sua vontade ou escolha (ex: idioma, formação familiar, lei, etc.). As sanções dos fatos sociais podem ser legais (prescritas por leis) ou espontâneas (afloram em decorrência de uma conduta não adaptada à estrutura do grupo ou da sociedade à qual pertence o indivíduo). A educação (formal e informal) tem um importante papel na conformação dos indivíduos à sociedade. Com ela, pelo tempo, as regras se tornam internalizadas e viram hábito.

Exterioridade - Eles atuam sobre os indivíduos independentemente de sua vontade ou de sua adesão consciente. São exteriores ao indivíduo e estão presentes na sociedade antes mesmo do nascimento do indivíduo.

Generalidade – é social todo fato que é geral, que se repete em todos os indivíduos ou na maioria deles (ex: as formas de habitação, de comunicação, os sentimentos e a moral). Os fenômenos devem sempre ser considerados em suas manifestações coletivas, distinguindo-se dos acontecimentos individuais ou acidentais. A generalidade distingue o essencial do fortuito e especifica a natureza sociológica dos fenômenos (Costa, 1997, p. 61).

Exemplo de fato social abordado por Durkheim: o suicídio. É geral, pois existe em todas as sociedades; apresenta, por suas manifestações, certa regularidade (embora tenha particularidades variantes caso a caso); recrudesce ou diminui de intensidade em certas condições históricas, demonstrando sua natureza social.
O fato social é considerado normal quando presente em todas as sociedades. Por exemplo, o crime. É ruim, mas acontece em todas as sociedades e acaba por integrar as pessoas em torno de uma conduta valorativa, que pune o comportamento considerado nocivo.

A normalidade do fato social e a sua generalidade demonstram a vontade coletiva (o consenso social a respeito de determinado fato). O fato é patológico quando se encontra fora dos limites permitidos pela ordem social e pela moral vigente (cuidado: não é patológico,por exemplo, uma doença, pois que transitórias e excepcionais. Seria um fato patológico a condição da sociedade européia após as revoluções industrial e burguesa). Aquilo que põe em risco a harmonia e o consenso representa um estado mórbido da sociedade.

A consciência coletiva revela, no interior de qualquer grupo ou sociedade, formas padronizadas de conduta ou comportamento (mesmo existindo as consciências individuais – formas particulares de ver e interpretar a realidade).
A sociedade é uma síntese. O grupo possui uma mentalidade, uma consciência coletiva.

Consciência comum ou coletiva corresponde ao “conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade” que “forma um sistema determinado com vida própria [...] produz um mundo de sentimentos, de idéias, de imagens” (Durkheim na obra Da divisão do trabalho social, apud Costa, 1997, p. 62).
É a consciência coletiva que determina em certa sociedade o imoral, o reprovável, o criminoso.

A solidariedade social é responsável pela coesão entre os membros dos grupos Ela pode ser mecânica ou orgânica. A mecânica é a existente em sociedades pré-capitalistas, em que os indivíduos se identificavam por meio da família, religião, tradição e costumes, permanecendo em geral independentes e autônomos em relação à divisão do trabalho social. A orgânica é típica das sociedades capitalistas, em que a divisão do trabalho torna os indivíduos interdependentes – essa interdependência garante a coesão social em lugar dos costumes e das tradições. Na sociedade capitalista a consciência coletiva se afrouxa e a autonomia pessoal entre os indivíduos cresce, ao mesmo tempo em que são ainda dependentes.

OBS: O conceito de anomia, visto linhas acima foi introduzido na sociologia por Durkheim (anomia ou patologia social: rompimento de adequação de valores morais na sociedade, distanciamento de qualidade de vida).


4.2 Max Weber (1864-1920)


Também se preocupou em conferir à sociologia um caráter científico. Para ele um cientista não tinha e direito de possuir, a partir de sua profissão, preferências políticas e ideológicas – “neutralidade científica” (Martins, 2007, p. 62).

Acusa a debilidade da burguesia alemã de sua época para controlar o poder político, mesmo dominando a vida econômica, o que abriu um formidável espaço para a burocracia enfeixar em suas mãos a direção do Estado. A burocracia, que geralmente recrutava seus membros na nobreza, passava a impor a toda sociedade suas opções políticas (na dicção de Weber esse fato constituía a “ditadura do funcionário”).

Mesmo concordando com as idéias de Marx sobre a relação entre economia, política e cultura, não compartilhava do princípio de que a economia dominava as demais esferas da realidade social. Para ele Marx privilegiou demais a realidade econômica, como condicionante, em relação às demais. Para ele essa evidencia demandaria uma pesquisa mais apurada

A análise da religião teve papel importante na teoria de Weber. Desejou compreender a influência dessa esfera na conduta econômica dos indivíduos de uma sociedade. Escreveu a obra “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, publicada em 1905, tese em que relacionou a influência dos princípios da ética protestante no desenvolvimento de uma certa racionalidade nos indivíduos que teria influenciado no desenvolvimento do sistema capitalista. Esclarece-se, não obstante, que essa tese de Weber buscou demonstrar apenas uma suposta influência (religiosa) entre outras mais que auxiliaram no desenvolvimento do capitalismo. Ele não quis demonstrar que esse fator foi o único e exclusivo.

Ficou famoso pela teoria de autoridade da burocracia – segundo essa teoria, um homem pode ser pago para agir e se comportar de certa maneira preestabelecida, a qual lhe deve ser explicada com exatidão, muito minuciosamente e em hipótese alguma permitindo que suas emoções interfiram no seu desempenho.

Burocracia é uma forma de racionalização humana que se baseia na racionalidade na adequação dos meios aos objetivos (fins) pretendidos, a fim de garantir a máxima eficiência possível no alcance desses objetivos.

A burocracia é a organização típica da sociedade moderna democrática e das grandes empresas. Prever organização, normas e regulamentos. A forma de Estado moderno expressa a racionalização da dominação política.

Da administração pública à gestão dos negócios privados, da máfia à polícia, dos cuidados com a saúde às prática de lazer, escolas, clubes, partidos políticos, igrejas, todas as instituições, tenham elas fins ideais ou materiais, estruturam-se e atuam através do instrumento cada vez mais universal e eficaz de se exercer a dominação que é a burocracia.

Cuida-se da execução dos deveres e dos direitos dos que se submetem a ela.

A especialização é necessária para o exercício de cargos ou funções e é claramente determinada.

Substituição de herança familiar ou parental e de amizade por leis ou regulamentações administrativas.
A organização burocrática é hierárquica, e o recrutamento para seus quadros dá-se através de concursos ou de outros critérios objetivos.

O tipo ideal do burocrata é o do funcionário que age em cooperação com outros, cujo ofício é separado de sua vida familiar e pessoal, regulamentado por mandatos e pela exigência de competência, conhecimento e perícia, e que não pode usar dos bens do Estado em proveito próprio ou apropriar-se deles. O burocrata não se subordina – como sucede, por exemplo, na forma de dominação feudal ou patrimonial – a uma pessoa como a um senhor ou patriarca, mas coloca-se a serviço de uma finalidade objetiva impessoal. O funcionário público, por exemplo – pelo menos num estado moderno avançado - não é considerado um empregado particular de um soberano.

O processo de burocratização também ocorre na economia e na empresa moderna a partir do estabelecimento de um controle contábil de custos, de formas racionais de organização do trabalho, e da mecanização.

Com a burocracia os indivíduos tenderiam a se tornar mais racionais em suas ações.


Por fim, frisa-se que Weber não era um entusiasta da modernização trazida pelo capitalismo e da forma de racionalização desenvolvida pelo homem ocidental. A grande racionalização da vida no Ocidente, abarcando campos como a música, o direito e a economia implicava num grande custo para o homem moderno. O mundo se mostrava cada vez mais intelectualizado, especializado e artificial, o que abandonava de vez os aspectos mágicos e intuitivos do pensamento e da existência.
Não via nenhum atrativo no movimento socialista porque ele acentuaria (o Estado socialista) esses aspectos da racionalização e burocratização da vida contemporânea. Como o filósofo Friedrich Nietzsche, tinha uma visão pessimista, uma apreciação melancólica dos tempos modernos, capitulando, por sua visão sociológica, de forma resignada diante da realidade social.


4.3 Karl Marx (1818-1883)



Sociólogo crítico e radical do capitalismo. Desenvolveu a teoria de fatos econômicos a partir da luta de classes, o “motor da história”.
Emprega, em sua análise, o método dialético (inspiração hegeliana – relação entre tese e antítese para a formação de uma síntese), mas voltado não ao campo das idéias, mas da realidade material da sociedade. Daí o nome materialismo dialético (as classes sociais, em dado momento histórico, compõem a tese e a antítese – têm interesses antagônicos – e a relação dialética de luta entre essas classes faz surgir uma nova situação material, a síntese).

Método dialético:

Tudo se relaciona (conexão universal);
Tudo se transforma (eterno desenvolvimento – motor da história);
Mudança qualitativa;
Luta dos contrários



Principais conceitos:

· Alienação
· Ideologia
· Fetichismo
· Mais valia

Resumidamente (serão melhor desenvolvidos em seguida):

Mais valia:


O sistema capitalista consiste na produção de mercadorias. Mercadoria é tudo o que produzido não tendo em vista o valor de uso, mas o valor obtido com a venda do produto.

Mais valia é o valor que o operário cria além do valor de sua força de trabalho, e que é apropriado pelo capitalista. Ele trabalha horas suficientes para produzir, em valores, muito mais que o seu salário, mas a parte que não recebe é destinada ao capitalista empregador, dono dos meios de produção e da matéria-prima.

Alienação:

O fundamento da alienação, para Marx, encontra-se a atividade humana prática: o trabalho – o fato econômico é “o estranhamento entre o trabalhador e sua produção”.
O operário não se reconhece no produto que criou, em condições que escapam a seu arbítrio e às vezes até a sua compreensão, nem vê o trabalho qualquer finalidade que não seja a de garantir sua sobrevivência (pelo salário).

Ideologia:

· Ciência da formação das idéias; tratado das idéias em abstrato; sistema de idéias.
· Conjunto de idéias próprias de um grupo, de uma época, e que traduzem uma situação histórica.
· Filosofia: Conjunto articulado de idéias, valores, opiniões, crenças, etc., que expressam e reforçam as relações que conferem unidade a determinado grupo social (classe, partido político, seita religiosa, etc.) seja qual for o grau de consciência que disso tenham seus portadores.


Fetichismo

Feitiço – artefato com forças estranhas capaz de exercer poder sobre os crentes e adoradores. Da mesma forma, a mercadoria surge não como resultado de relação de produção, mas valendo por si mesma, como realidade autônoma e, mais ainda, como determinante da vida dos homens.

A produção determina não só o objeto do consumo, mas também o modo de consumo, e não só de forma objetiva, mas também subjetiva. Logo, a produção cria o consumidor.

“Força de trabalho humano torna-se mercadoria.” No capitalismo o empregado, sem outra saída, já que por seus produtos artesanais não se matem no mercado, é obrigado a vender sua força de trabalho para produzir as mercadorias que beneficiarão o capitalista. O trabalho que desempenha não é gratificante porque o trabalhador não vê o resultado de seu trabalho, não tem pra si o valor real que dele se pode obter com a venda e participa, na produção, de apenas parte da confecção da mercadoria (em razão da divisão do trabalho). O trabalhador, nesses termos, não vê o resultado final de seu trabalho, apenas fica repetindo os mesmos movimentos e tarefas durante sua jornada laboral.
A força de trabalho é comercializada, portanto. Torna-se mercadoria e não força individual e expressão livre humana de transformação do ambiente natural.

OBS. 1: Esse assunto será trabalhado com maior profundidade pelo texto: “Trabalho: liberdade e submissão” a ser fornecido pelo professor.

OBS. 2: Sobre a teoria de Karl Marx, leia as linhas que se seguem, que tratam mais especificamente da matéria:

“Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que importa é transformá-lo” (crítica de Marx ao jovem hegeliano, de esquerda, Feuerbach – XI tese sobre Feuerbach).

Marx considera a filosofia teórica da tradição como uma simples forma de idealismo, desvinculada da realidade social concreta e, nesse sentido, inútil. Mas, mesmo assim, se considera seu pensamento como situado como parte da tradição moderna da filosofia crítica. Marx pretende buscar um método filosófico para combater as ilusões da consciência e, assim, libertar o homem.

Marx diz que a interpretação hegeliana (de Hegel) do processo histórico, da dialética e da formação da consciência restringe-se ao plano das idéias e representações, do saber e da cultura, não levando em conta as bases materiais da sociedade em que este saber e esta cultura são produzidos e em que a consciência individual é formada. O exame crítico de Hegel não é suficientemente radical, não chegando a examinar as causas últimas, os pressupostos mais fundamentais. Das três dimensões da formação da consciência de Hegel (vida moral, linguagem e trabalho), Marx privilegia o trabalho como a mais fundamental.

Para Marx, o trabalho é a práxis social e histórica do homem. É a relação dos seres humanos com a natureza e entre si, na produção das condições de sua existência, Nesse ponto, Marx chaga a afirmar, juntamente com Engels, no Manifesto, que os seres humanos não se distinguem dos animais porque possuem consciência, nem porque sejam naturalmente sociáveis e políticos, mas porque são capazes de produzir as condições de sua existência material e intelectual.

Em Marx, ao contrário de Hegel, as idéias do homem são determinadas pela “terra”, pelas condições materiais de sua vida. A consciência não é livre e determinada, ela é condicionada pelo trabalho.
Marx concluiu, por suas pesquisas, que “as relações legais e as formas políticas não poderiam ser explicadas, seja por si mesmas, seja como provenientes do assim chamado desenvolvimento geral da mente humana, mas que, ao contrário, elas se originam das condições materiais da vida ou da totalidade que Hegel, seguindo o exemplo dos pensadores [...] do século XVIII, engloba no termo ‘sociedade civil’“ (apud Marcondes, 2005a, p. 228).

A questão central da análise de Marx passa a ser, portanto, o trabalho (relação invariante entre a espécie humana e seu ambiente natural, uma perpétua necessidade natural da vida humana).
O trabalho é um sistema de ação instrumental e contingente. Ele surge na evolução da espécie, mas condiciona nosso conhecimento da natureza ao interesse no possível controle técnico dos processos naturais.
O mundo que existimos é, nesse sentido, constituído pela relação material de trabalho do homem com a natureza. Dependendo da organização social do trabalho, a objetificação da natureza muda na história. Mas não só a natureza é alterada, também o é o próprio homem (não há uma essência humana fixa).

A História é a verdadeira história natural do homem. O materialismo histórico de Marx pretende ser uma teoria científica da história. Ele analisa os diferentes estágios, caracterizados pelo conceito de relações de produção, que levaram a humanidade, desde a sociedade primitiva, passando pela sociedade escravocrata e pela sociedade feudal, até a sociedade burguesa de sua época.

Para Marx, a filosofia, conforme até então concebida, estava esgotada, de modo que a sua filosofia é conhecida com a do fim da história. Para Marx, a filosofia indica a necessidade da prática revolucionária de “transformar o mundo”. A análise filosófica tem que se estender à economia, política, história, sociologia. E a reflexão teórica deve dar lugar a uma prática revolucionária transformadora, por meio de uma concepção de unidade entre teoria e prática.
Sobre a crítica da Ideologia:

No texto A Ideologia alemã, Marx critica os filósofos hegelianos sustentando que eles, na tentativa de criticar a religião em prol de uma emancipação calcada no iluminismo, acabam por ignorar que a própria religião é instrumento das classes dominantes para preservar o poder político e econômico, e não a causa dessa dominação (a religião seria o ópio do povo).

A ideologia surgiu do trabalho de um pensador iluminista chamado Antoine Destrutt de Tracy, que tinha a proposta de formular uma ciência das idéias como uma espécie de história natural das idéias, examinando a origem e o processo de formação das idéias no homem. Pretendiam fornecer, em última análise, as bases para, por meio da educação, uma reforma da sociedade no espírito iluminista.

Mas Marx, com Engels, concebe o termo ideologia como falsa consciência, atribuindo-lhe um sentido negativo. A análise de Feuerbach, no caso, acaba sendo ideológica, porque não investiga criticamente as verdadeiras causas do fenômeno religioso.

A ideologia seria, assim, o mascaramento da realidade – se uma realidade opressora que faz com que o seu caráter negativo seja ocultado. A classe que tem à sua disposição os meios de produção material dispõe, ao mesmo tempo, dos meios de produção intelectual. As idéias dominantes nada mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes concebidas como idéias.
A representação da classe dominante como sendo a verdadeira realidade produz uma aparente legitimação das condições existentes numa determinada sociedade em um período histórico determinado. Produz-se, com isso, uma forma de alienação da consciência humana de sua situação real de existência (as relações de produção). A tarefa da ideologia é evitar que a estrutura social profundamente desigual explicite-se no nível da consciência, e evitar que as classes sociais entrem em choque, em luta deflagrada (por uma revolta, obviamente, da classe oprimida).

A tarefa da filosofia crítica é desmascarar a ideologia. No entanto, se a filosofia não leva em conta as origens materiais da ideologia na relação de dominação existente na sociedade, ela torna-se inócua, senão uma parte da ideologia.

Por fim, vale ressaltar que, para Marx, a sociedade civil é mesmo o que os teóricos do liberalismo disseram, uma esfera econômica de interesses privados, é a economia de mercado capitalista. E o Estado, longe de ser a expressão da vontade geral e do interesse geral, o Estado é a expressão legal, jurídica e policial dos interesses de uma classe social particular, a classe dos proprietários privados dos meios de produção ou classe dominante.

A revolução:

Em uma sociedade determinada, no seu processo histórico de luta de classes, os conflitos e as contradições internas do próprio processo de dominação vão levar à crise dos sistemas econômicos e políticos, tornando possível a transformação da sociedade pela via da revolução. E quanto à religião, ao contrário do que diziam os iluministas, os homens não devem se libertar dela para conseguir liberdade política. Os homens só se libertarão da religião (no caso força exercida pelos poderosos burgueses) quando conquistarem a liberdade política.

Segundo Marx,

A crítica não retira as flores imaginárias que cobrem as algemas para que os homens as suportem sem fantasia nem consolo, mas para que se libertem e colham a flor viva.

E, como disse no Manifesto do Partido Comunista, “em lugar da velha sociedade, com suas classes e seus antagonismos de classe, teremos uma associação na qual o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos”.
Marx acreditava que a revolução ocorreria na Inglaterra, o país capitalista mais avançado na época e, portanto, com um proletariado mais organizado e consciente e com crises externas mais explícitas. Lênin, contudo, acreditou que poderia implantar o socialismo na Rússia, um país essencialmente agrícola, sem um proletariado forte. Lênin amoldou em certa medida a doutrina de Marx, pois dela retirou, em certa medida, a herança hegeliana do forte determinismo histórico, enfatizando o papel do indivíduo, do intelectual revolucionário e do partido como vanguarda do proletariado.


Uma crítica do século XX: A Escola de Frankfurt

O saber tecnicista relega o interesse pela emancipação. A crítica dos frankfurtianos se volta à racionalidade técnica e instrumental que teria dominado a sociedade moderna com a Revolução Industrial. O diagnóstico da presença e império desse tipo de saber na sociedade atual levou os filósofos frankfurtianos ao pessimismo em relação á capacidade emancipatória do homem (diferente, todavia, em Habermas, crente ainda num projeto moderno de racionalidade pela comunicação e pelo consenso entre indivíduos racionais e livres – a modernidade é, para ele, um projeto inacabado).
Alguns dos aspectos centrais dessa dominação da técnica são a indústria cultural (e a arte como mercadoria) e a massificação do conhecimento, da arte e da cultura que produzem, diluindo assim sua força expressiva, seu significado próprio, transformando tudo em objeto de consumo.
Os frankfurtianos não são essencialmente revolucionários, eles apenas buscam inspiração na teoria marxista para uma análise da sociedade contemporânea, além de desenvolver o conceito de teoria crítica e de crítica da ideologia em uma perspectiva filosófica e sociológica.
Teoria crítica: 1) razão instrumental – técnico-científica. Intimidação do homem; 2) razão crítica – emancipatória do gênero humano.
As mudanças sociais, políticas e culturais só se realizarão verdadeiramente se tiverem como finalidade a emancipação do gênero humano e não as idéias de controle e domínio técnico-científico sobre a sociedade, a natureza e a cultura. De modo contrário, torna-se irremediável a inversão do domínio entre criador e criatura.

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